A Família Yates no Brasil



Memorial da Fome, na borda do rio Liffey, em Dublin, com esculturas que representam os emigrantes e uma réplica do navio que transportou irlandeses a outras terras.
A Irlanda procura pistas dos antigos imigrantes no Brasil
A presença dos imigrantes no Brasil tem sido estudada na Irlanda, onde muitas instituições de pesquisa resgatam o drama da Grande Fome e a fuga de mais de um milhão de habitantes para outros países, principalmente para os Estados Unidos e a Grã-Bretanha. Em Dublin, estátuas que representam um grande grupo de famintos estão colocadas junto ao cais.
Há pelo menos duas réplicas de navios que transportaram migrantes funcionando como museus, abertos à visitação. Os navios recriam o ambiente onde os imigrantes viveram durante semanas, transportando-se para uma nova terra. Um dos navios se chama Jeanie Johnston, está ancorado m Dublin. O outro é o Dunbrody, que fica no porto em New Ross, no condado de Wexford.
O jornalista e historiador Hilary Murphy, repórter e editor em vários jornais de Wexford e ex-editor e membro honorário do Journal of the Wexford Historical Society, já falecido, foi um dos que participaram dessa investigação, rastreando a história das familias irlandesas, especialmente do condado de Wexford, e reunindo dados genealógicos. Ele publicou o artigo "‘A Wexford Colony in Brazil’, na revista Irish Roots Magazine, edição nº 88, no final de 2013. Também tem publicado livros sobre o tema. Um deles é um compêndio de história dos nomes de famílias – “Families of county Wexford”. Em 1986, ele publicou um artigo no Journal of the Irish Family History Society - "When Wexford farmers emigrated to Brazil" - , onde são reproduzidas algumas das impressões dos antigos moradores da colônia Dom Pedro II, no século XIX, sobre a nova terra onde estavam instalados.
Os colonos falavam sobre suas vidas na colônia, sobre o ambiente no Brasil, a produção das lavouras e o tratamento que recebiam por parte dos brasileiros. Esse artigo está reproduzido abaixo, com tradução de Isabella Wondracek Azambuja:
“Quando agricultores de Wexford emigraram para o Brasil"
Hilary Murphy
Quando o bispo de Ferns, Donal Herlihy, organizou a Missão Ferns para o Brasil em 1981, ele estava restabelecendo uma ligação com o grupo de colonos da baronia de Forth, que 132 anos antes foram assentados na colônia Dom Pedro II, na província do Rio Grande do Sul, cheios de esperança de uma vida melhor após a grande crise de fome em seu país. Eles partiram de Liverpool, em março de 1849, sob os auspícios do Almirante Grenfell, cônsul-geral brasileiro em Liverpool, que providenciou uma quantia considerável de dinheiro para a compra de uma área de terra onde os imigrantes de Wexford pudessem se estabelecer. Eles chegaram ao seu novo mundo sem implementos ou outros meios, mas logo foram despachados de Liverpool equipamentos agrícolas, sementes, etc. Em 1851, esses pioneiros irlandeses foram seguidos ao Brasil por mais 140 pessoas.
Uma Sociedade Auxiliadora foi criada em Liverpool (Nota de Adelia: no Brasil, a informação é que a Sociedade Auxiliadora era brasileira, fundada em Pelotas, responsável pela compra da terra e pelo povoamento), o que garantiu aos irlandeses que emigraram com suas famílias lotes de 150 acres, perto de uma grande cidade, provisões para 12 meses, assistência em suas terras e implementos agrícolas quando necessário. O preço dos lotes era de cerca de 60 libras esterlinas, juntamente com a assistência para as provisões, etc, e devia ser pago em parcelas durante três, quatro ou cinco anos, sem juros. Após esse período 6% de juros eram cobrados sobre o saldo. A cara passagem de Liverpool também foi subsidiada. O Brasil naquela época era pouco povoado por Portugal, pois este país não tinha população excedente para colonização extensiva. Ingleses e outros tinham ido como residentes temporários, trabalhando com cavalos, couro de vaca, chifres e imensos rebanhos de ovelhas.
Em 1851, os imigrantes irlandeses responderam questionários oficiais sobre as terras que ocuparam, o estado dos cultivos e sua satisfação com os contratos. Suas respostas foram enviadas ao comissário chefe da colônia Dom Pedro II.
mesmo tenho batatas, aveia, cevada, milho e feijão de boa qualidade e esperamos ter um bom trigo no próximo ano. Espero ver a colônia com produção abundante em breve. Estou muito contente e ficaria feliz que todos os outros se sentissem assim também. Todos os que já se instalaram falam bem da colônia”.
"O país tem um clima verdadeiramente bom, saudável e é lindo com o rio, planície, montanha, floresta, colina e vale. É minha profunda aspiração que em data não distante poderei contemplar neste belo país uma colheita em todo o seu esplendor.
Todos que conhecemos nos tratam com a maior gentileza. Serão fornecidos gêneros e utensílios para todos que necessitarem nas seguintes porções por dia: um quilo de carne, nove xícaras de feijão, oito xícaras de farinha, 1,5 quilo de açúcar, um quilo de bacon, 1,5 xícara de café. Cada família receberá 30 velas por mês, dois quilos de sabão, dois metros de tabaco e mais de tudo o que for necessário. Os comissários fornecem bois, cavalos, etc. As pessoas que vierem para cá devem trazer o máximo possível de implementos agrícolas. Há cinco anos para pagar pela terra. Se não for paga, serão cobrados juros de 6% ao ano”.
James Murphy, de Bridgetown. Co. Wexford, escreveu: "O país tem um clima verdadeiramente bom, saudável e é lindo com o rio, planície, montanha, floresta, colina e vale. É minha profunda aspiração que em data não distante poderei contemplar neste belo país uma colheita em todo o seu esplendor. Os brasileiros, em geral, são amigáveis, gentis e hospitaleiros, complacentes e dispostos a apoiar, e a única coisa que lamento é não poder falar o idioma. Em relação às colheitas que tenho eu pouco posso dizer, já que o trigo que trouxe não cresceu, exceto 100 grãos, alguns grãos de cevada, embora cerca de um quinto da produção seja de Meyle . A porção de terra atribuída a cada colono é de 100.00 braças (cerca de 96 hectares). Disso, eu lavro alguns hectares. Meu trigo não cresceu, eu replantei com milho (trigo brasileiro) e aveia e todos estão crescendo muito bem. Tenho boas batatas, das quais espero excelentes sementes para o ano que vem. Recebi mais gentileza, hospitalidade e encorajamento dos cavalheiros com os quais me relaciono como agricultor do que jamais recebi do senhorio na Irlanda, que teve todos os lucros do meu trabalho desde a minha infância. Se algum emigrante deseja vir para este país, com a expectativa de continuar com agricultura e deseja trazer consigo sementes do seu próprio país, é indispensável colocá-las em recipientes herméticos. Caso contrário, elas não germinarão bem”.
George Kearney, de Carne, em Wexford, escreveu: “Estou feliz em informar que está comprovado que a colônia Dom Pedro tem boas terras para produzir boas colheitas. EuSou
Outro dos imigrantes de Wexford, John Parle, escreveu: “Estou contente com o contrato e com o tratamento que tenho recebido da Sociedade (Sociedade Auxiliadora)”.
Em carta para seu irmão em Carne, condado de Wexford, Peter Meyler escreveu: “Escrevo para informá-lo de nossa chegada segura, depois de uma viagem agradável e rápida, de 49 dias. Em nossa chegada, fomos levados à barra por um navio, cerca de um quilômetro acima de Rio Grande, quando Mr. Morgan e vários outros senhores vieram a bordo e nos levaram junto com nossas bagagens em seu iate e nos trouxeram para Pelotas. Mr. Morgan nos levou para as terras e indicou os lotes de cada um. O meu é de 150 acres. É um solo bom, rico e arenoso, com 18 centímetros de profundidade, tão bom os melhores solos de Carne.